Sob pressão, Bolsonaro endossa carta anônima sobre renúncia ou golpe

De acordo com texto, que Bolsonaro alega ser de um autor anônimo, o presidente chama o país de “ingovernável”.

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Em quatro meses de mandato, o presidente Jair Bolsonaro já falou até em guerra contra um país vizinho

Circula nas redes sociais, principalmente em grupo do WhatsApp, o texto de um autor anônimo, endossado pela Presidência da República, que sugere a renúncia do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ou uma dramática virada no sistema político brasileiro, em outro eventual golpe de Estado. O texto, compartilhado por Bolsonaro em um grupo de aliados, vazou para o diário conservador paulistano O Estado de S. Paulo, na noite passada, com repercussão ascendente ao longo deste sábado, tanto nas redes sociais quanto nas mídias conservadora e progressista.

De acordo com texto, que Bolsonaro alega ser de um autor anônimo, o presidente chama o país de “ingovernável”. Fala em “conchavos”; diz que “o presidente não serve para nada”, que “a hipótese mais provável é o governo morrer de inanição” e que pode vir aí “uma ruptura institucional irreversível com desfecho imprevisível”.

Analistas políticos e articulistas discordam se a mensagem trata de aviso sobre um iminente fechamento do Congresso e do Judiciário, em uma medida de força do Poder Executivo, ou se Bolsonaro está, na realidade, jogando a toalha, ao melhor estilo do presidente Jânio Quadros que, em agosto de 1961, abdicou do cargo apenas sete meses depois da posse.

Para o cientista político, sociólogo e pesquisador Alberto Carlos Almeida, esta é, “sim, uma carta de renúncia”.

Sondagem

“Mas vinda de Bolsonaro pode ser qualquer coisa. Ele é muito burro: não conhece a língua portuguesa, não sabe utilizar símbolos, não entende dos detalhes da política. Assim, para ele, essa carta pode ser qualquer coisa”, escreveu Almeida.

O jornalista declaradamente de direita Reinaldo Azevedo, colunista diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, disse que depois da carta “sobram dois caminhos a Bolsonaro: a renúncia ou o suicídio”.

“Eu sugiro o primeiro”, acrescenta Azevedo.

Líder do Governo, no Senado, Major Olímpio (PSL-SP) avalia o texto sob outro ponto de vista. Para o senador, trata-se de um desabafo, “um grito de alerta”, disse ele a jornalistas, nesta manhã. Bolsonaro passa por dificuldades que se multiplicam, dia após dia. A aprovação ao seu governo cai, de sondagem para sondagem. Sua agenda tem sido rejeitada no Congresso.

Mobilização

Seu filho primogênito, o senador Flávio Bolsonaro, é investigado por ligação com as milícias armadas que atuam no Estado do Rio e, nas últimas horas, a cotação do dólar subiu a valores equivalentes aos de antes da eleição. Não bastassem os obstáculos adiante, analistas já preveem encolhimento do PIB em 2019.

— Uma tempestade perfeita — afirmou outro analista, ouvido pela reportagem do Correio do Brasil.

Ainda neste sábado, após divulgar o texto endossado por Bolsonaro, publicamente, O Estado de S. Paulo alerta, em editorial, que o país está diante de um iminente golpe de Estado. Segundo o editorial do Estadão, Bolsonaro prepara um golpe contra a democracia, “afrontando Congresso e Justiça”.

Um dos sinais, segundo o jornal, seria a participação pessoal do presidente no movimento para que haja uma mobilização contra o que ele classifica, sem detalhar, de “sistema”.

Soluções autoritárias

“O presidente Jair Bolsonaro considera impossível governar o Brasil respeitando as instituições democráticas, especialmente o Congresso. Em sua visão, essas instituições estão tomadas por corporações – que ele não tem brio para nomear – que inviabilizam a administração pública, situação que abre caminho para uma ‘ruptura institucional irreversível’ – conforme afirma em texto que fez circular por WhatsApp ontem, corroborando-o integralmente, como se ele próprio o tivesse escrito”, afirma o jornal.

“Ao compartilhar o texto, qualificando-o de ‘leitura obrigatória’ para ‘quem se preocupa em se antecipar aos fatos’, Bolsonaro expressou de maneira clara que, sendo incapaz de garantir a governabilidade pela via democrática – por meio de articulação política com o Congresso legitimamente eleito –, considera natural e até inevitável a ocorrência de uma ‘ruptura”, acrescenta.

Ainda segundo o diário conservador paulistano, “não é de hoje que o presidente se mostra inclinado a soluções autoritárias. Depois da posse, Bolsonaro mais de uma vez manifestou desconforto com a necessidade de lançar-se a negociações políticas para fazer avançar a agenda governista no Congresso”.

Eleitores

“Confundindo deliberadamente o diálogo com deputados e senadores com corrupção, o presidente na verdade preparava terreno para desqualificar os políticos e a própria política – atitude nada surpreendente para quem passou quase três décadas como parlamentar medíocre a ofender adversários e a louvar a ditadura militar. Não por acaso, o próprio Congresso parece ter desistido de esperar que Bolsonaro se esforce para dialogar e resolveu tocar por conta própria a agenda de reformas.

“Desde sua posse como presidente, Bolsonaro vem demonstrando um chocante despreparo para o exercício do cargo, mas o problema podia ser contornado com a escolha de ministros competentes. Com exceção de um punhado de assessores que realmente parecem saber o que fazem, porém, o governo está apinhado de sabujos cuja única função ali parece ser a de confirmar os devaneios do presidente, dos filhos deste e de um ex-astrólogo que serve a todos eles de guru, dando a fantasias conspiratórias ares de realidade.

“O texto que Bolsonaro divulgou – recomendando que fosse passado adiante – diz que ‘bastaram cinco meses de um governo atípico, ‘sem jeito’ com o Congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores’. Segundo o texto, o presidente ‘não aprovou nada, só tentou e fracassou’ porque ‘a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente nenhuma corporação’.

Relações

“Nas atuais circunstâncias, ‘a continuar tudo como está, as corporações vão comandar o governo Bolsonaro na marra’ – e, ‘na hipótese mais provável’, diz o texto, ‘o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações’. Mas diz também que é “claramente possível” que o país fique ‘ingovernável’, igualando-se à Venezuela. Aí entraria a tal ‘ruptura institucional’ de que fala o texto chancelado por Bolsonaro – que o usou para ilustrar o risco que diz correr de ser assassinado pelo ‘sistema’.

“Isso é claramente uma ameaça à Nação. Conforme se considere o estado psicológico de Bolsonaro e de seus filhos, a ameaça pode ser o tsunami de uma renúncia ou o tsunami de um golpe de Estado em preparação. Pois o presidente não apenas distribuiu o texto, como mandou seu porta-voz dizer que, embora esteja ‘colocando todo o meu esforço para governar o Brasil’, a ‘mudança na forma de governar não agrada àqueles grupos que no passado se beneficiavam das relações pouco republicanas’.

“Em seguida, fez um apelo às ruas: ‘Quero contar com a sociedade para juntos revertermos essa situação’ – e já no próximo dia 26 está prevista a realização de uma manifestação bolsonarista, contra ministros do Supremo Tribunal Federal e a favor do pacote anticrime do ministro da Justiça, Sergio Moro.

Apocalíptico

Ao ‘contar com a sociedade’ para enfrentar o ‘sistema’, Bolsonaro repete o roteiro de outros governantes que, despreparados para a vida democrática – em que a vontade do presidente é limitada por freios e contrapesos institucionais –, flertaram com golpes em nome da “salvação” nacional. Se tudo isso não passar de mais um devaneio, já será bastante ruim para um país que mergulha cada vez mais na crise, que tem seu fulcro não nas misteriosas “corporações” – as suas ‘forças ocultas’ –, mas na incapacidade do presidente de governar”, afirma o editorial.

Para o jornalista, escritor e dramaturgo Marcelo Rubens Paiva, “Bolsonaro se parece cada vez mais com Jânio Quadro, o antipolítico eleito pela direita, não pelo partido tradicional (UDN), para combater o getulismo e a corrupção, que, sem base, de um partido pequeno, incapaz de negociar, teimoso, popular e turrão, renunciou”.

No outro lado do tabuleiro político, o ex-chanceler tucano Aloysio Nunes segue na mesma direção: “O texto apocalíptico encampado por Bolsonaro guarda inquietante analogia com a carta da renúncia, verdadeiro manifesto em prol de autogolpe, em que Jânio pretextava ação de ‘forças terríveis’ para justificar o fracasso de seus projetos.

Leia a íntegra do texto compartilhado por Bolsonaro nas últimas horas, em grupos de WhatsApp:

“Texto apavorante – Leitura obrigatória

Alexandre Szn

Temos muito para agradecer a Bolsonaro. Bastaram 5 meses de um governo atípico, “sem jeito” com o congresso e de comunicação amadora para nos mostrar que o Brasil nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com o interesse dos eleitores. Sejam eles de esquerda ou de direita.

Desde a tal compra de votos para a reeleição, os conchavos para a privatização, o mensalão, o petrolão e o tal “presidencialismo de coalizão”, o Brasil é governado exclusivamente para atender aos interesses de corporações com acesso privilegiado ao orçamento público.

Não só políticos, mas servidores­sindicalistas, sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de poder. Os verdadeiros donos do orçamento. As lagostas do STF e os espumantes com quatro prêmios internacionais são só a face gourmet do nosso absolutismo orçamentário.

Todos nós sabíamos disso, mas queríamos acreditar que era só um efeito de determinado governo corrupto ou cooptado. Na próxima eleição, tudo poderia mudar. Infelizmente não era isso, não era pontual. Bolsonaro provou que o Brasil, fora desses conchavos, é ingovernável.

Descobrimos que não existe nenhum compromisso de campanha que pode ser cumprido sem que as corporações deem suas bênçãos. Sempre a contragosto. Nem uma simples redução do número de ministérios pode ser feita. Corremos o risco de uma MP caducar e o Brasil ser OBRIGADO a ter 29 ministérios e voltar para a estrutura do Temer.

Isso é do interesse de quem? Qual é o propósito de o congresso ter que aprovar a estrutura do executivo, que é exclusivamente do interesse operacional deste último, além de ser promessa de campanha?

Querem, na verdade, é manter nichos de controle sobre o orçamento para indicar os ministros que vão permitir sangrar estes recursos para objetivos não republicanos. Historinha com mais de 500 anos por aqui.

Que poder, de fato, tem o presidente do Brasil? Até o momento, como todas as suas ações foram ou serão questionadas no congresso e na justiça, apostaria que o presidente não serve para NADA, exceto para organizar o governo no interesse das corporações. Fora isso, não governa.

Se não negocia com o congresso, é amador e não sabe fazer política. Se negocia, sucumbiu à velha política. O que resta, se 100% dos caminhos estão errados na visão dos “ana(lfabe)listas políticos”?

A continuar tudo como está, as corporações vão comandar o governo Bolsonaro na marra e aprovar o mínimo para que o Brasil não quebre, apenas para continuarem mantendo seus privilégios.

O moribundo-­Brasil será mantido vivo por aparelhos para que os privilegiados continuem mamando. É fato inegável. Está assim há 519 anos, morto, mas procriando. Foi assim, provavelmente continuará assim.

Antes de Bolsonaro vivíamos em um cativeiro, sequestrados pelas corporações, mas tínhamos a falsa impressão de que nossos representantes eleitos tinham efetivo poder de apresentar suas agendas.

Era falso, FHC foi reeleito prometendo segurar o dólar e soltou­ 2 meses depois, Lula foi eleito criticando a política de FHC e nomeou um presidente do Bank Boston, fez reforma da previdência e aumentou os juros, Dilma foi eleita criticando o neoliberalismo e indicou Joaquim Levy. Tudo para manter o cadáver procriando por múltiplos de 4 anos.

Agora, como a agenda de Bolsonaro não é do interesse de praticamente NENHUMA corporação (pelo jeito nem dos militares), o sequestro fica mais evidente e o cárcere começa a se mostrar sufocante.

Na hipótese mais provável, o governo será desidratado até morrer de inanição, com vitória para as corporações. Que sempre venceram. Daremos adeus Moro, Mansueto e Guedes. Estão atrapalhando as corporações, não terão lugar por muito tempo.

Na pior hipótese ficamos ingovernáveis e os agentes econômicos, internos e externos, desistem do Brasil. Teremos um orçamento destruído, aumentando o desemprego, a inflação e com calotes generalizados. Perfeitamente plausível.

Claramente possível.

A hipótese nuclear é uma ruptura institucional irreversível, com desfecho imprevisível. É o Brasil sendo zerado, sem direito para ninguém e sem dinheiro para nada. Não se sabe como será reconstruído. Não é impossível, basta olhar para a Argentina e para a Venezuela. A economia destes países não é funcional. Podemos chegar lá, está longe de ser impossível.

Agradeçamos a Bolsonaro, pois em menos de 5 meses provou de forma inequívoca que o Brasil só é governável se atender o interesse das corporações.

Nunca será governável para atender ao interesse dos eleitores. Quaisquer eleitores. Tenho certeza que esquerdistas não votaram em Dilma para Joaquim Levy ser indicado ministro. Foi o que aconteceu, pois precisavam manter o cadáver Brasil procriando. Sem controle do orçamento, as corporações morrem.

O Brasil está disfuncional. Como nunca antes. Bolsonaro não é culpado pela disfuncionalidade, pois não destruiu nada, aliás, até agora não fez nada de fato, não aprovou nada, só tentou e fracassou. Ele é só um óculos com grau certo, para vermos que o rei sempre esteve nu, e é horroroso.

Infelizmente o diagnóstico racional é claro: “Sell”.

Autor desconhecido”.

Fonte: CdB

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