Bolsonaro perde densidade política e se aproxima do impeachment

Durante visita à Câmara, o mandatário em risco de perder o cargo entregou, nesta terça-feira, ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), um projeto de lei.

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Líder do Governo no Senado, Major Olímpio (PSL-SP) é o primeiro a reclamar da falta de articulação no Congresso

O presidente Jair Bolsonaro tenta, ao seu modo, distensionar o relacionamento do Executivo com o Parlamento, ao passo que sobe o clamor, nas ruas, para que seja aberto um novo pedido de impedimento contra ele. Sem aliados firmes tanto na Câmara quanto no Senado, Bolsonaro perde densidade política na crise econômica que se agrava.

Durante a visita, o mandatário em risco de perder o cargo entregou, nesta terça-feira, ao presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), um projeto de lei que dobra o limite de pontos em infrações na Carteira Nacional de Habilitação (CNH), de 20 para 40. O texto também aumenta a validade do documento para 10 anos.

O segundo passeio no edifício que saiu de um desenho do arquiteto comunista Oscar Niemeyer, em menos de uma semana, visa passar a ideia, ao público em geral, de que há um processo de entendimento entre o Planalto e o Congresso. Mas a já conhecida desarticulação política do governo segue em marcha acelerada.

Major Olímpio

Nos últimos dias, diante da falta de organização do Executivo junto aos parlamentares, duas medidas provisórias de seu interesse perderam o prazo de validade. E a crítica, novamente, partiu de um aliado.

— Sou líder do PSL no Senado e não recebo sequer uma nota técnica do governo falando sobre as teses a serem defendidas. Não sei os outros líderes, mas não recebo nada. Não recebemos nem alerta sobre a importância dos projetos. Se fazem isso comigo, que sou aliado, imagine com os demais — reclamou o senador Major Olímpio (PSL-SP), a jornalistas.

A falta de articulação do governo no Congresso e, mesmo com o próprio partido do presidente, chamou a atenção da cientista política Roseli Coelho, professora da Fundação Escola de Sociologia e Política. Para ela, o PSL é como “um ônibus que recrutou, de última hora, os oportunistas mais espertos”. Ela insere nesse contexto a escolha do senador paulista como líder do partido no Senado, um posto que demanda habilidade de negociação, mesmo sendo Major Olímpio uma pessoa conhecida por sua truculência.

Mandato

Diante uma pauta cada vez mais recorrente, no cenário político, no entanto, falta à esquerda “uma pauta” caso o processo de impeachment seja iniciado, segundo a professora.

— O cenário político poderia ficar ainda pior com o impeachment, e também a economia. O povo e os trabalhadores, em geral, sofreriam mais ainda — disse Roseli, nesta manhã, em entrevista à Rádio Brasil Atual (RBA).

Para o correspondente Juan Arias, do diário conservador espanhol El País, em artigo publicado nesta terça-feira, contudo, “o atual mandato presidencial no Brasil começou há pouco mais cinco meses, mas já começam a se escutar alarmes sobre a possibilidade de que Jair Bolsonaro não termine seu mandato”.

“Não só porque ele aparece sem um projeto de país concreto, mas também porque o pouco já realizado é alvo de duras crítica até por parte de muitos que o elegeram e hoje não o fariam, conforme mostram todas as pesquisas em que, apesar dos 57 milhões de votos conquistados nas urnas, seu apoio desvanece”.

Analfabetos

Arias cita uma recente pesquisa da Atlas Político, a qual mostrou que apenas 28% dos entrevistados consideravam sua gestão boa ou ótima, contra 36,2% que a veem como ruim ou péssima. Entre os que o apoiam estão um exército de radicais que desejaria devolver o Brasil aos tempos do pior obscurantismo, com uma política apoiada em messianismos alucinados, com suas preocupações fálicas e uma mórbida obsessão pelas armas.

“Poderia parecer incrível num país normal que em cinco meses de governo já se fale, abertamente, na possibilidade de impeachment do presidente. Não só pelo que ele não fez, mas também pelo que fez até agora, que está revelando uma forte desconfiança sobre sua capacidade de governar um Brasil-continente com 207 milhões de pessoas que já começaram a sair às ruas. E sobre como deseja conduzir o tema da educação, um ponto crucial deste país com ainda milhões de analfabetos funcionais e da qual depende também seu futuro econômico”, acrescentou.

O relacionamento entre Bolsonaro azedou de vez, na véspera do encontro realizado nesta manhã. Apesar do ambiente cordial, Maia disse a jornalistas que o Brasil “caminha para um colapso social” com o novo governo. Segundo o deputado, o Planalto ainda não soube apresentar um projeto para fazer frente às graves crises que afligem o país.

Campanha

Esta inatividade poderá levar o Brasil a uma catástrofe econômica, acrescenta Maia, se em vez de apoiar as reformas urgentes acabar boicotando-as para favorecer propostas milagrosas e “às vezes patéticas”, adiciona Árias.

“Preocupa à sociedade democrática um presidente que parece alheio às reformas enquanto se perde em fantasia messiânicas, como quando afirma que ainda ‘não nasceu para ser presidente’, pois foi algo que Deus lhe impôs. E assim repete, às vezes chorando diante das câmeras de televisão, enquanto levanta a camisa e mostra as cicatrizes do atentado que sofreu durante a campanha eleitoral. Deus, segundo ele, está ao seu lado e o escolheu como um novo Messias”, complementa o correspondente.

O jornalista espanhol percebeu que, “no Brasil já se fala, sem meias palavras, que o presidente Bolsonaro e a maior parte de seu Governo parecem ineptos para confrontar os grandes desafios que têm pela frente. Até agora parece, entretanto, que Bolsonaro continua em campanha eleitoral, dialogando só com o grupo de radicais de extrema direita que permaneceram fiéis a ele, sem ainda demonstrar que  quer ser o presidente de todos os brasileiros, como exige a Constituição”.

“O presidente continua confundindo as redes sociais com a realidade viva do país e parece ter aterrissado de outra galáxia, sem entender que o Brasil é uma nação que importa no mundo e que já aceitou a modernidade faz muito tempo. E, pior ainda, está destruindo no exterior, com sua incapacidade de governar e suas obsessões de caráter messiânico e psiquiátrico, a imagem positiva e até invejável até ontem atrelada a este país, coração econômico do continente e cadinho de mil experiências culturais que estão sendo pisoteadas”, conclui.

Do CdB

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